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Saúde Única e desastres: uma abordagem integrada para diminuir impactos e promover o bem-estar.

Este enfoque é essencial na compreensão e mitigação dos impactos dos desastres, que frequentemente afetam esses domínios simultaneamente.

Saúde Única (SU), também conhecida por “One Health” ou “Uma Só Saúde”, é um conceito integrado que reconhece a interconexão entre saúde humana, saúde animal e ambiente. Este enfoque é essencial na compreensão e mitigação dos impactos dos desastres, que frequentemente afetam esses domínios simultaneamente. Portanto, realizarei uma abordagem de como a SU pode ser aplicada para enfrentar e reduzir os efeitos de desastres, promovendo uma resposta mais eficiente e sustentável para a os animais, humanos e o ambiente que ocupam.

Em situações de desastres ambientais não se deve ignorar o conceito já consolidado de SU, pois podemos ter surtos de doenças zoonóticas e arboviroses. Um fator mitigante e fundamental neste contexto é manter os ecossistemas saudáveis.

Os desastres, sejam naturais (como terremotos, inundações e furacões) ou antropogênicos (como vazamentos químicos e acidentes industriais), têm impactos profundos e complexos nas três dimensões da SU, ou seja, Saúde HumanaSaúde Animal Saúde Ambiental.  A degradação ambiental após desastres pode resultar na contaminação de água e solo, afetando tanto a fauna quanto a flora. A poluição e a destruição de habitats também podem ter efeitos a longo prazo sobre a biodiversidade e a resiliência dos ecossistemas. 

Para enfrentar os desafios impostos pelos desastres, a abordagem de SU sugere uma estratégia integrada que envolve: Preparação e Planejamento Integrado (desenvolver planos de emergência que considerem SU. Isso inclui a coordenação entre serviços de saúde pública, veterinários e especialistas em meio ambiente); Monitoramento e Vigilância Conjunta (Implementar sistemas de vigilância que rastreiem doenças humanas, doenças em animais e mudanças ambientais que possam sinalizar emergências, permitindo uma resposta mais rápida e coordenada); Educação e Conscientização (promover a conscientização sobre como as práticas humanas podem impactar a saúde animal. Programas educativos devem incluir informações sobre a importância da prevenção de zoonoses e da proteção ambiental; Resposta Coordenada e Multissetorial (respostas que envolvam diferentes setores: fornecendo cuidados médicos e animais afetados e restaurar ecossistemas simultaneamente); Reconstrução Sustentável (Incluindo práticas de construção que minimizem o impacto ambiental e estratégias de recuperação que protejam a biodiversidade e a saúde pública). 

Exemplo de aplicação da SU em situações de desastres pode ser observado e vivenciado recentemente no Rio Grande do Sul, durante as inundações severas. Provocando inúmeras mortes de pessoas e animais, perdas econômicas significativas á sociedade, com danos imensuráveis ao meio ambiente, ocasionando a contaminação da água e consequentemente, o aumento de doenças infecciosas em humanos e animais, como a leptospirose e as arboviroses. Considerando essa situação das inundações no RS, nos questionamos como profissionais da saúde, estamos preparados para enfrentar as diversidades de um desastre? A gestão pública, seja ela municipal, estadual ou federal está apta a enfrentar essas situações em relação a competência financeira, mão de obra técnica qualificada e rapidez de ação? Os diferentes profissionais conseguem trabalhar em consonância e sincronia? A sociedade necessitaria estar mais preparada para o enfrentamento destes incidentes, que parecem estar ocorrendo com mais frequência?  São perguntas com respostas difíceis e complexas, pois esses problemas exigem uma abordagem multifacetada que envolva melhorias em planejamento, infraestrutura, comunicação, educação e políticas públicas para fortalecer a capacidade do Brasil de enfrentar e se recuperar de desastres.

Imagem cedida pela médica- veterinária Ruana Renostro Delai
Imagem cedida pela médica- veterinária Ruana Renostro Delai

Na sequência, alguns relatos de médicos-veterinários que atuaram diretamente nas ações de SU, ou seja, resgates e/ou cuidados com animais feridos, controle de zoonoses, educação e aconselhamento para as comunidades dos municípios de Canoas e São Leopoldo, afetados nas enchentes de 2024 no Rio Grande do Sul:

O médico-veterinário Marcos Torres (Anestesiologista) relatou que o desrespeito ao meio ambiente e a falta de controle sobre a população animal impactou de forma significativa a saúde humana e o bem-estar de todos na ocasião das inundações do RS. Enfatiza também que a colaboração com outros profissionais da área da saúde e com a comunidade foi muito importante, porém falta preparo e conhecimento dos profissionais para estas situações.

A médica-veterinária Silvana Krychak (Patologia, Parasitologia e Microbiologia) ressalta que nas primeiras semanas do evento, faltou apoio de órgãos públicos e infraestrutura para abrigar os voluntários. O impacto psicológico causado pela situação inicial das inundações, a sensação de impotência ao vivenciar o sofrimento de todos e encontrar soluções para a quantidade de animais resgatados foram os desafios maiores. 

De acordo com Ruana Renostro Delai (Medicina do coletivo), representando a REMAD-PR (Rede Estadual de Manejo de Animais em Desastres) e Defesa Civil-PR, a SU é essencial para a prevenção de doenças e promoção da saúde de todos. Portanto, como a gestão pública e a sociedade lidam com a saúde das pessoas, animais e meio ambiente antes e após o desastre, é determinante na promoção e efetividade da SU. Ressalta ainda, que o monitoramento e controle de zoonoses, quando realizado de maneira rigorosa e efetiva, podem reduzir os surtos de doenças zoonóticas, como a leptospirose, que necessita de abordagem preventiva de diferentes setores, como controle de roedores, saneamento básico e educação em saúde da população. 

Outro ponto importante foi levantado por Lorena de Oliveira (Medicina do Coletivo), que o principal desafio enfrentado pelos médicos-veterinários foi o despreparo técnico e emocional para o contexto. O apoio de muitos médicos-veterinários, das mais diversas áreas, foi essencial para cobrir a extensa demanda gerada pelas enchentes. Porém, a maioria não tinha familiaridade com a realidade vivida e com os protocolos técnicos que devem ser instituídos e seguidos num desastre, os quais são distintos daqueles aplicáveis a uma rotina particular tradicional.

Ana Julia Santos Thoma (Medicina do Coletivo) acredita que os principais desafios foram a sobrecarga de trabalho, pressão emocional ao lidar com situações de sofrimento e falta de respaldo da gestão pública (apoio logístico e execução das ações).

João Henrique Farinhas (Medicina do Coletivo) ressalta que num desastre, os profissionais voluntários auxiliam com os conhecimentos e experiências pessoais de vida, gerando desencontros de informações e discussões desnecessárias.  As capacitações sobre desastres ajudam a organizar e otimizar o trabalho numa situação de caos. Lembra também, em desastres estamos numa situação  que o sistema todo já falhou, as necessidades básicas ficam complicadas e lidamos com assuntos aleatórios que comprometem o desempenho técnico profissional.

Todos os profissionais aqui mencionados possuem o conceito de SU consolidado, mas não receberam preparo para situações de desastres durante sua graduação. Os que relatam estar preparados, obtiveram conhecimento e preparo na pós-graduação e, tão importante quanto, sentiram falta da gestão publica nas primeiras semanas do evento.

Resumindo, podemos levar em consideração que necessitamos de preparo técnico e emocional com abordagem de SU, para atuarmos em desastres. Sendo que este preparo, pode ser oferecido nos cursos de graduação de todas as áreas, como por exemplo, nas atividades complementares. Com mais profissionais preparados obteríamos soluções mais eficientes e rápidas para os problemas enfrentados nas diversidades de um desastre.

A abordagem de SU oferece uma estrutura valiosa para enfrentar os desafios complexos e interconectados apresentados pelos desastres, pois é possível a realizar previamente, análises de risco na interação homem – animal – meio ambiente. Ao reconhecer e abordar a interdependência entre a saúde humana, animal e ambiental, podemos desenvolver estratégias eficazes e sustentáveis para minimizar os impactos de desastres e promover uma recuperação robusta e integrada. A colaboração interdisciplinar e o planejamento estratégico são essenciais para criar comunidades mais resilientes e preparadas para enfrentar futuros desafios.

Agradecimentos: Agradeço imensamente aos profissionais aqui mencionados pelas entrevistas concedidas, bem como a todos os profissionais que atuaram na ocasião das inundações no Rio Grande do Sul em 2024, pois sem dúvida, foi significativo o resultado observado pela sociedade nacional, sobre o trabalho árduo e competente de todos. 

Imagem cedida pela médica-veterinária Amanda Prichla
Imagem cedida pela médica-veterinária Amanda Prichla
Imagem cedida pela médica- veterinária Ruana Renostro Delai
Imagem cedida pela médica- veterinária Ruana Renostro Delai

Luciana Sartori

CRMV-PR 3105 Médica-Veterinária Professora Titular Farmacologia e Toxicologia Veterinária | Curso de Medicina Veterinária | Pós-Graduação em Ciência Animal | Escola de Ciências da Vida | Pontifícia Universidade Católica do Paraná
Claudia Turra Pimpão

Cláudia Pimpão

CRMV-PR 3105

Médica-veterinária
Professora Titular Farmacologia e Toxicologia Veterinária | Curso de Medicina Veterinária | Pós-Graduação em Ciência Animal | Escola de Ciências da Vida | Pontifícia Universidade Católica do Paraná

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